domingo, 19 de dezembro de 2010
Por Gustavo Lucena*
A atuação do Conselho de Administração no Brasil, em sua maioria é estratégica, diferentemente do que acontece nos EUA, onde o grande foco dos Conselhos de Administração daquele país é o compliance adotando o princípio “comply or explain”, deixando a gestão estratégia na mão da diretoria. Há a necessidade de existir um equilíbrio entre as duas responsabilidades. Isto porque, no final, quem será responsabilizado por esses dois temas é o Conselho de Administração, já que é ele que elege a diretoria da sua companhia. O Brasil não pode seguir o caminho dos EUA, onde, com a Sarbanes-Oxley, o compliance passou a ser mais importante do que a própria estratégia, para o conselheiro evitar ser preso ou perder seu bônus. Mas, também o Brasil não pode esquecer-se do compliance, senão os conselheiros serão penalizados por atos que não são de sua responsabilidade e sim de sua diretoria.
Desta forma, o equilíbrio entre o foco do Conselho de Administração ser estratégico e de compliance somente será balanceado se a companhia possuir uma área de Compliance funcional independente e estratégica, e não como em muitas companhias aonde essas áreas são subordinadas administrativa e funcionalmente as diretorias financeiras e administrativas com objetivos meramente de eficiência operacional e/ou de “crises de não-conformidades” aonde o tema compliance é tratado como projetos internos que possuem prazos para iniciar e terminar.
Um compliance-officer precisa ter um nível de senioridade que reflita a importância do compliance dentro da companhia, conhecer o ambiente regulatório ao qual a companhia está inserida, as regras do novo mercado, das boas práticas de governança corporativa, das leis internacionais emitidas pela SEC e dos programas internacionais de anticorrupção, com um histórico de integridade e comprometimento com o compliance, com capacidade e postura para comandar a aceitação de sugestões e orientações nas mais diversas camadas de dentro e de fora da companhia além de uma formação condizente com os temas a serem monitorados pela sua gestão.
A área de Compliance deveria exercer um papel de consultor gratuito dentro da sua companhia para estabelecer caminhos que efetivamente levassem a companhia e seus empregados a respeitar e praticar a boa governança no seu dia-dia, sendo conhecedor da sua estratégia e alinhado a esta programas de compliance mutáveis e dinâmicos para apoiar os conselheiros em suas tomadas de decisão quase sempre estratégicas. Um longo caminho precisa ser trilhado devendo manter-se ativamente envolvidas com os stakeholders e shareholders para garantir que a companhia, como um todo, tome decisões em compliance estando preparada para a complexidade do ambiente regulatório e, assim como os Departamentos de Auditoria Interna, conquistar sua comunicação direta com os membros do Conselho de Administração e Comitê de Auditoria para aconselhar a administração de forma adequada da velocidade das mudanças nas regulamentações e ausência de claridade no que tange às expectativas regulatórias, coibindo as decisões equivocadas de negócios.
As companhias brasileiras ainda lidam com o insuficiente número de profissionais e pouca expertise acumulada nessa área e em determinadas vezes os compliance-officers atuam como “inspetores” para atender aos objetivos que lhes foram colocados de eficiência operacional e/ou de “crises de não-conformidades”, sendo confundidos com as atribuições da Auditoria Interna e não são vistos como conselheiros/consultores o que tem dificultado a companhia em demonstrar facilmente a ausência de penalidades e multas e/ou um menor número de multas e penalidades comparado aos pares e concorrentes, o que pode transparecer uma limitação na instalação das boas práticas de governança corporativa da sua companhia.
*Gustavo Amaral de Lucena – Fundador e Diretor de Produtos e Desenvolvimento do Instituto de Compliance e Integridade Corporativa (ICIC) e Diretor da consultoria de Governança, Gestão de Riscos e Compliance da PwC. (gustavo.lucena@br.pwc.com)